DEPENDÊNCIA QUÍMICA E SUA REDE DE CODEPENDÊNCIA

11 de abril de 2018

O transtorno de dependências, abusos e compulsões é uma doença epidêmica da contemporaneidade que está agravando continuamente. Porque, na atual conjuntura onde valorizamos a competição, o individualismo, o poder sem ideologia, o acúmulo egoísta e a imposição imperativa ao prazer imediato, enfatizamos, cada vez mais, a dinâmica psíquica do dependente patológico e, consequentemente, todo complexo intersubjetivo que essa doença provoca no seu entorno relacional, despertando as codependências no âmbito físico (material e corporal), familiar, amoroso, profissional, social e espiritual.

Todos somos dependentes, pois não existe a possibilidade de qualquer manifestação de vida livre e independente de outras vidas, porque sem as trocas, em todos os sentidos, a vida deixa de acontecer. Mas, infelizmente, por conta de vários distúrbios psicoafetivos, algumas pessoas, por não conseguirem lidar com a realidade cotidiana que naturalmente é geradora de sentimentos de angústia, apreensão, medo, insegurança, incerteza, expectativa, frustação e fracasso, acabam buscando artifícios para superar a realidade diária e ordinária, na ilusão de terem independência, poder e liberdade,

A relação com esses artifícios, comportamentais ou químicos, que são elementos objetais capazes de transformar tudo e todos em objetos de uso e, consequentemente, de abuso, provocam no indivíduo, num primeiro momento, uma experiência eufórica – fora do eu cotidiano – para depois leva-lo ao declínio ético, moral, físico e relacional. O interessante é que nesta dinâmica, em pouco tempo, o próprio indivíduo passa a ser apenas mais um objeto que necessita consumir objetos, instalando-se a o transtorno de dependência patológica e sua rede de codependência.

Mais especificamente, na toxicomania, que é a forma mais degradante das dependências patológicas, podemos ver a exuberância do complexo manifesto tanto nas famílias quanto nos meios clínicos, que se propõem a tratar dos drogadictos. Por isso existe tanta passionalidade e muito fracasso, com contínuas recaídas, porque enquanto o dependente não for transformado em sujeito capaz de estabelecer vínculo amoroso com ele mesmo, e depois com os demais, ele continuará sendo apenas objeto de uso e abusos em busca apenas de relações objetais, de forma totalmente egoísta, consumista sem a capacidade de gratidão.

Neste sentido, o sucesso no tratamento destas pessoas tão sofridas, a meu ver, depende do vínculo amoroso com algum terapeuta capacitado e consciente do risco da codependência, assim como do espelhamento da sua dependência por meio de participação de grupos de dependentes, apesar do risco destes também retroalimentarem a codependência. Porque, com o terapeuta, o indivíduo vai poder compreender sua baixa tolerância a frustação, aceitar o cotidiano enfadonho, apesar da sua memória eufórica da época do uso da substancia de abuso, e começar a estabelecer uma relação subjetiva. No grupo ele vai poder compreender a dinâmica das dependências, reconhecendo-se apenas como mais um em busca da abstinência e serenidade.

Despois disso, com a fissura menos presente, o caminho deve ser o de encontrar um sentido e um significado para a vida, com prazer em servir. Assim o indivíduo poderá se sentir útil, realizador e até satisfeito com as suas conquistas, apesar de toda angústia que é a vida cotidiana, preferencialmente, também engajado em ajudar outros dependentes a se libertarem das suas condições de meros objetos.

Waldemar Magaldi Filho, psicólogo, mestre e doutor em ciências da religião, fundador e coordenador dos cursos de pós-graduação que titulam e formam especialistas em Psicologia Analítica, Psicossomática, Arteterapia e Dependências do IJEP – Instituto Junguiano de Ensino e Pesquisa        –       www.ijep.com.br


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